Este ano, a Lei nº 8.213/91, conhecida como Lei de Cotas, completa mais de duas décadas de existência. A norma determina que o número de pessoas com deficiência no quadro de empregados irá variar de acordo com o número de funcionários da empresa.

A cota foi fixada em 2% para quem tem entre 100 e 200 funcionários, 3% para 201 a 500 funcionários, 4% para aqueles que possuem entre 501 e 1000 e 5% para as empresas cujo quadro supera os mil empregados. O advogado Alexandre Leitão, responsável pelo Núcleo de Direito do Trabalho do escritório Helder Nascimento Advogados produziu o artigo abaixo sobre o tema em questão.

Por Alexandre Leitão

As empresas cada vez mais vêm sendo fiscalizadas tanto pelo Ministério Público do Trabalho como pelo Ministério do Trabalho e Emprego com o fito de serem observadas as cotas destinadas a empregados portadores de deficiência. As multas pelo não cumprimento dessa legislação são elevadas e vêm causando grandes impactos nos empregadores, de natureza financeira e organizacional.

Bastante comum, atualmente, depararmo-nos com anúncios em rádios e jornais veiculados por pessoas jurídicas em busca do preenchimento de tais cotas, denotando a pressão a qual estão submetidas pelos órgãos fiscalizadores e o paulatino abandono de uma postura passiva antes por elas assumida. A “Lei das Cotas” não mais e “só para inglês ver”, a fiscalização de seu cumprimento e o peso das sanções a ela correlatas estão gerando, mesmo que forçadamente, a introdução de novos elementos na cultura e nas rotinas empresariais.

Imprescindível ressaltar-se que o preenchimento dessas cotas normalmente não é fácil, haja vista a carência de trabalhadores treinados e aptos a se adequarem à realidade das atividades das empresas, mormente quando nessas preponderam trabalhos especializados. Porém, a adequação dos postos de trabalho é vista pelos órgãos fiscalizadores como um ônus dos empregadores, havendo na maioria das vezes uma insensibilidade daqueles para a dificuldade em encontrarem-se portadores de deficiência aptos a serem contratados. Certo é que a exigência legal para o preenchimento dessas cotas é uma realidade, a lei “não é morta”, como se diz popularmente , ” a lei pegou”, e há quem a ferrenhamente fiscalize. Os empregadores devem, pois, procurar cumpri-la e resguardarem-se no curso desse desafio, fazendo provas de que estão constantemente atrás de satisfazer tais cotas. Essas provas consistem na veiculação de anúncios em meios de comunicação social, a exemplo dos já citados, e expedição de ofícios para entidades que promovem a capacitação de trabalhadores. São elas de suma importância para afastar a aplicação de multas, inibir o ajuizamento de ações civis públicas e demonstrar a boa-fé das empresas e seu esforço no sentido respeitar a legislação que fixa tais cotas.

O descuido nesse processo e a falta de rotina e provas que indiquem a constante saga das empresas para preencher tais cotas podem gerar prejuízos ainda maiores para elas, devendo essas conscientizarem-se da relevância do cumprimento ou tentativa de observância dessas exigências. Não desprezível ser destacado que, infelizmente, são insatisfatórios os números de profissionais portadores de deficiência aptos a ser contratados, a sistematização do cadastramento de seus nomes pelas entidades capacitadoras e quantidade de entidades que realizam eficientemente esse trabalho. São obstáculos a serem superados e ponderados pelos órgãos fiscalizadores.

Deveria haver um maior esforço e incentivo do Governo Federal, através do Ministério do Trabalho e Emprego, na elaboração de um eficiente programa de recrutamento, capacitação e cadastramento de trabalhadores portadores de deficiência, com o fim de proporcionar uma maior facilidade para suas contratações, minimizando os hercúleos esforços que muitos empregadores fazem para admitir esse tipo de trabalhador e contribuir para o alcance da finalidade das normas que foram editadas com o fim de promover a integração social dessas pessoas.

A leitura dessa situação pelos órgãos fiscalizadores é muitas vezes injusta, somente sendo condicionada a eficácia social da referida lei aos esforços que devem ser realizados pelos empregadores, deixando de considerar-se a obrigação do Estado de desenvolver meios para auxiliar as empresas nesse processo e de promover a educação e integração no mercado de trabalho dos portadores de deficiência. Recursos existem para esse desiderato, como, por exemplo, os destinados ao Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT), que melhor deveriam ser aplicados nesse sentido, mas infelizmente se perdem muitas vezes em ações questionáveis e ineficazes, restando somente às empresas e aos portadores de deficiência uma dura realidade: às primeiras, fiscalizações e multas; aos segundos, dificuldade de alocação no mercado de trabalho.

A lei que fixa as cotas para contratação de trabalhadores portadores de deficiência é sem dúvida um avanço para a superação da democracia formal, a concretização da igualdade material, o tratamento desigual dos desiguais, a realização de caros valores e preceitos fundamentais insertos na Constituição Federal, Lei Maior do Estado Brasileiro, mas não pode ser aplicada de forma dissociada da realidade, sem que cada um dos agentes nesse processo, em especial o Estado e a iniciativa privada, equilibradamente exerçam seus papéis, sob pena de limitação da eficácia social dessa legislação.